Não é novidade que o enredo da Imperatriz Leopoldinense sobre os povos que habitam o Parque Indígena do Xingu, no Mato Grosso, desagradou o setor do agronegócio nacional. Apesar do tom mais brando que a confusão ganhou desde que o carnavalesco a Cahê Rodrigues classificou como um mal-entendido, novos fatos colocam mais lenha na fogueira que faz o desfile da verde e branco ser um dos mais aguardados deste Carnaval.

“Eles (empresários) ficaram com vergonha”, diz indígena:
A proposta teria sido transmitida através da Fundação Nacional do Índio, a Funai, e pela Associação Terra Indígena do Xingu, a Atix, numa reunião entre lideranças das 16 etnias no dia 4 de janeiro deste ano. O relato completo foi feito à esta reportagem numa conversa do WhatsApp com um habitante da região que preferiu não se identificar. Além dele, outro morador da região confirmou as informações através de uma ligação telefônica.
– Eram R$ 15 milhões que (empresários) do agronegócio estavam oferecendo ao povo do Xingu através da Funai.
A mensagem era que o dinheiro estava sendo oferecido para não participarmos do Carnaval da Imperatriz. Queriam pagar indígenas para não irmos mais participar do desfile. Essa era a proposta. Ficamos quietos até que saíram falando contra os indígenas. Sabemos que o agronegócio está destruindo a terra indígena com os agrotóxicos, o assoreamento do Rio Xingu, a extinção de peixes… Está acontecendo. Esse enredo vai mostrar a verdade do que está acontecendo realmente aqui no Xingu. Eles ficaram com vergonha porque vamos falar para o mundo – afirma um dos índios que prefere ter a identidade resguardada.
Ainda segundo o entrevistado, o oferecimento milionário seria fruto de união entre empresários de pelo menos três municípios que ficam próximos ao Parque Indígena.
– Eles (a Funai e a Atix) falaram que vários fazendeiros da região que estavam oferecendo.
De Canarana, Gaúcha do Norte e Querência, municípios que ficam em torno do Xingu. Estavam tentando se juntar para dar o dinheiro para a Funai – comenta.
Procuradas, a Associação Terra Indígena do Xingu e a Fundação Nacional do Índio negaram que a proposta tenha existido. Em nota, o órgão indigenista oficial do governo federal afirmou que “desconhece a proposta financeira, não fez esse tipo de intermediação e não informou sobre a suposta oferta aos indígenas”.
A negativa partiu da assessoria de imprensa da Funai sob o comando de uma nova gestão, que assumiu a fundação em 13 de janeiro (pouco mais de uma semana depois da reunião com a suposta oferta). O novo mandatário é Antônio Fernandes Toninho Costa, nomeado pelo ex-ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Em 4 de janeiro, quem ocupava o cargo era o interino Agostinho do Nascimento Neto.
A presidência da Funai, aliás, tem gerado debates desde o início do governo Temer. Moraes havia indicado o general Sebastião Roberto Peternelli Júnior, mas precisou recuar por conta de uma polêmica. O militar comemorou o aniversário do golpe militar de 1964 através das redes sociais e acabou não sendo empossado após ser duramente criticado por lideranças indígenas, ativistas, jornalistas e internautas.
Alegando que o governo pretendia escolher alguém com “outro perfil”, o responsável pela pasta da Justiça voltou atrás e nomeou temporariamente Agostinho Neto. Há um mês, trocou novamente e empossou Toninho Costa. Na semana passada, Moraes foi indicado pelo presidente Michel Temer para ocupar a vaga deixada por Teori Zavascki no Supremo Tribunal Federal.
Além das alterações administrativas, Moraes também foi responsável por reformar a política de demarcação de terras indígenas. No dia 17 de janeiro, ele criou o que chama de Grupo Técnico Especializado (GTE) com a missão de “fornecer subsídios em assuntos que envolvam demarcação de terra indígena”, papel que antes cabia apenas à Funai.